O que é permacultura?
A palavra permacultura originou-se da expressão em inglês “permanent agriculture“, porém, hoje, devido a ampliação de sua abrangência pode-se dizer que a permacultura deriva da expressão “cultura permanente”. E por isso mesmo não é fácil defini-la em poucas palavras. Então vamos usar aqui uma definição formal apresentada há muito tempo atrás pelo próprio Bill Mollison, que juntamente com David Holmgren estão desenvolvendo a permacultura, desde o início dos anos 1970, na Austrália, unindo culturas ancestrais sobreviventes com os conhecimentos da ciência moderna.
Permacultura é um sistema de design para a criação de ambientes humanos sustentáveis e produtivos em equilíbrio e harmonia com a natureza.
Bill Mollison
O que é a Permacultura?
“Permanent Agriculture” em inglês – nasceu na cabeça de Bill Mollison, ex-professor universitário australiano, na década de 1970. Refugiado das loucuras da sociedade de consumo, Mollison percebeu que nem os cantos remotos do interior australiano onde morava seria poupado do colapso planetário iminente – a flora e a fauna estavam diminuindo sensivelmente…
“Resolvi”, falou Mollison na sua passagem pelo Brasil em junho de 1992, “que, se voltasse para o mundo, voltaria com uma coisa muito positiva”.
Foi assim que nasceu a ideia, juntamente com David Holmgren, de criar sistemas de florestas produtivas para substituir as monoculturas de trigo e soja, responsáveis pelo desmatamento mundial. Observando e imitando as formas de florestas naturais do lugar, revelou-se possível a criação de sistemas altamente produtivos, estáveis e recuperadores dos ecossistemas locais.
Depois de dez anos implantando, com grande sucesso, tais sistemas em todos os continentes, Mollison, Holmgren e seus colaboradores perceberam que não adianta concentrar-se em sistemas naturais sem considerar os outros sistemas tão vitais para a sobrevivência humana: sistemas monetários, urbanos (arquitetura, reciclagem de lixo e águas), sociais e de crenças. A “Permanent Culture“.
Hoje a permacultura conta com mais de 10.000 praticantes em todos os continentes e mais de 220 professores trabalhando em tempo integral. A permacultura chegou no Brasil através do primeiro curso dado por Bill Mollison, em Porto Alegre. Hoje existe uma equipe de profissionais – agrônomos, engenheiros, arquitetos, etc. – que estão se aprofundando nestas idéias e que já fundaram o primeiro sistema LETS de troca de serviços da América Latina.
Baseada na prática de “Cuidar da Terra, cuidar dos homens e compartilhar os excedentes” (quer sejam dinheiro, tempo ou informações), a permacultura ousa acreditar na possibilidade da abundância para toda a humanidade através do uso intensivo de todos os espaços, através do aproveitamento e geração de energia, da reciclagem de todos os produtos (acabando assim com a poluição) e através da cooperação entre os homens para resolver os grandes e perigosos problemas que hoje assolam o planeta.
Princípios Éticos: |
- Cuidados com o planeta
- Cuidados com as pessoas
- Limites ao consumo e ao crescimento da população, compartilhando excedentes
Outras referências:
http://www.permaculture.co.uk/articles/what-permaculture-part-1-ethics e http://permacultureprinciples.com/ethics/
Princípios de Planejamento:
Por Bill Mollison, em “Permaculture: A designers manual“, 1988:
Portanto:
Quando criamos sistemas auto-sustentados, não precisamos trabalhar para alimentar e proteger os elementos do sistema. Uma floresta produtiva, uma vez estabelecida, exige muito pouco cuidado para se manter, Comparados com as monoculturas, sistemas altamente artificiais que nunca ocorrerão na natureza, sistemas permaculturais que se aproximam da natureza não precisam de adubo, irrigação nem defensivos. Produzem séculos a fio e melhoram cada vez mais o solo, recuperando também o regime das águas da região.
Scott Pittman O homem está longe de aproveitar plenamente os seus dons criativos. No planejamento de uma propriedade, reflexão e observação podem mostrar soluções engenhosas para os problemas, evitando gastos e trabalho. Podemos aproveitar ao máximo a força da gravidade, por exemplo, para a distribuição da água, colocando áreas de captação no alto da propriedade em vez de colocá-las, como muitos fazem nas baixas, e depois depender de bombas, Ou podemos observar que os animais de modo geral depositam mais esterco de noite do que de dia. O gado pode pastar nas áreas ricas das baixadas durante o dia e dormir em estábulos no alto da propriedade, retransportando assim os nutriente para o alto da propriedade, de onde, com a ajuda da força da gravidade, a distribuição se torna mais fácil.
Problemas apontam situações especiais que podem ter uma função única. Se uma área é árida, por exemplo, pode-se especializar em plantas da família dos cactos, como o Figo da Índia ou a cochonilha, um inseto que produz uma tinta valiosa e que se desenvolve no cactos Opuntia. Se uma encosta é pedregosa, ela pode oferecer condições especiais para certas plantas que não de adaptariam em outra áreas mais férteis da propriedade. Se as lavouras sofrem ataques de caracóis, sinal que esta região se presta para a criação destes. Todo problema aponta para uma oportunidade. É questão de enfoque.
A estabilidade de uma propriedade ou de uma comunidade depende da disponibilidade de uma gama de produtos espalhados ao longo do ano. Isto protege contra desastres climáticos, porque no caso de qualquer emergência (seca, tempestade), alguns dos produtos vão escapar, devido a uma resistência maior, ou devido ao fato de crescer em épocas diferentes. Deve-se sempre cogitar culturas de emergência, garantidas de dar alguma produção mesmo sob condições adversas. Os povos antigos fazem policulturas por este motivo. Policulturas que incorporam árvores no sistema são as mais estáveis do todas. Uma floresta produtiva dificilmente se abate com a seca ou com o granizo.
Quando uma parte do sistema sustenta outra, evita-se a necessidade de procurar insumos fora da propriedade, fortalecendo assim todo o sistema. Da mesma maneira, uma comunidade inteira ganha estabilidade quando os produtos circulam localmente, evitando assim perdas por desperdício ou sangria para uma metrópole central. Considerando, por exemplo, que um terão dos produtos agrícolas no Brasil se perdem antes de chegar à mesa do consumidor, podemos ver a importância do consumo local, que assegura que o que se produz não se perde no processo de transporte e distribuição.
Tivemos o privilégio de poder ainda desfrutar de florestas, de beber água limpa , de contemplar paisagens belas. Os nossos netos também têm este direito, e cabe a nós a responsabilidade de assegurar que estes direitos sejam respeitados. Isto pode sugerir muitas frentes de ação: conservação de áreas naturais ainda pouco modificadas pelo homem; desenvolvimento de uma forma de agricultura não devastadora; proteção das águas, especialmente do lençol freático. (Um rio pode-se limpar em poucos anos. Um lençol freático, uma vez poluído, dificilmente se limpa de novo). Em termos práticos, uma floresta desmatada leva entre doze a vinte anos para se recompor, e leva entre sessenta e duzentos anos para chegar a um estágio parecido ao original. Se colhermos somente as árvores no final do seus ciclos e plantarmos culturas adaptadas a estas condições de mata, podemos manter a cobertura vegetal e mesmo assim ter uma boa renda. Cada tipo de árvore tem as suas utilidades. Hoje, nos desmatamentos, a grande massa de madeira (com exceção das árvores mais conhecidas como o mogno) é desperdiçada.
Não há soluções em grande escala para problemas locais. Não há soluções tecnológicas para problemas que são basicamente sociais. Cada vez que uma família consegue se auto-sustentar, produzindo os seus próprios alimentos e reciclando os seus dejetos, esta deixa de participar da agricultura devastadora e deixa de poluir. Cada propriedade, mesmo bem pequena, pode captar água e produzir alimentos. As possibilidades são infinitas: podemos usar toda parede e até telhados das construções para produzir alimentos. Podemos captar água numa variedade de maneiras e reciclar toda água que utilizamos, fazendo-a render muito mais. Tomando como exemplo a perigosa falta de água potável: poucas pessoas se dão conta de que a descarga doméstica gasta 40% de toda a água consumida. Isto representa 100 litros de água por pessoa por dia! Pode-se imaginar a gravidade desta situação numa cidade de milhares ou milhões de pessoas. Podemos dar descarga com a água servida das pias ou do chuveiro, evitando assim este desperdício desastroso para toda a humanidade. Em áreas mais suburbanas ou rurais, podemos desenvolver privadas secas, das quais existem muitos modelos eficazes hoje. Lembrando que os esgotos são também grandes fatores de poluição de lagos, de rios e do mar, vemos a importância do tratamento doméstico dos efluentes através de filtros ou de sistemas com plantas. Uma aldeia (ou bairro) de 300 pessoas tem a capacidade humana de preencher todas as necessidades das pessoas do lugar. Mesmo numa situação urbana, pode-se aproveitar os espaços baldios para produzir alimentos e pequenos animais. Cada vez que isto ocorre, economiza-se petróleo e espaços naturais que hoje estão sendo desmatados para produzir alimentos em grande escala. Plantações pequenas e intensivas são muito mais produtivas em qualquer lugar do mundo. O pavor de falta de terras agrícolas é um mito: toda terra pode ser agrícola! O que se chama “agrícola” hoje são aquelas onde pode-se entrar com máquinas pesadas, comprovadamente destruidoras da estrutura do solo. De fato, as terras mais “agrícolas”, em termos de produção, são aquelas frente à porta da cozinha! (é claro que o grande problema é o fato da agricultura se industrializar e ser vista como produtora de dinheiro. Isto levanta grandes problemas práticos, já que se destrói para ganhar a curto tempo. Isto vai acabar de fato somente quando houver ou uma pressão pública em massa ou quando tais sistemas não forem mais viáveis economicamente. Há sinais de que os dois processo estão acontecendo. O aumento de custos em petróleo e agrotóxicos faz com que a agricultura intensiva e orgânica hoje se torne muito mais lucrativa. Se os problemas são basicamente domésticos e podem ser resolvidos a nível doméstico, isto implica que nós podemos resolver os nossos problemas, não precisando de algum engenheiro ou outro especialista, ou o governo, etc. para dar as soluções. O poder da ação volta para as mãos do indivíduo, da família, ou da comunidade local.
Quando falamos em “energia”, podemos pensar em calorias. Vários levantamentos tem mostrado que a agricultura industrializada é, em muitos casos, deficitária energeticamente: para cada caloria de alimento produzida, gastam-se duas a oito (ou mais!) calorias na forma de petróleo (transporte, insumos, máquinas agrícolas, etc.). Qualquer sistema deficitário, que seja em termos monetários ou energéticos, é fadado a falir, cedo ou tarde. Os sistemas permaculturais se tornam produtores energéticos de várias maneiras:
O espírito de cooperação é a grande chave para a recuperação da qualidade de vida no planeta. Vista em termos sociais, a cooperação nos leva a ver todo estranho como amigo em potencial, enquanto a competição nos ensina a ver todo estranho com adversário em potencial. Esta mudança de atitude traz mudanças de comportamento fundamentais. Na cooperação, a energia é gasta de uma maneira mais construtiva, somando a energia de uns com os outros, em vez de se anularem mutuamente, como é o caso da competição. Na agricultura, esta mudança de atitude também transforma o comportamento. Se uma praga ataca a lavoura, um agricultor que se baseia em cooperação com a natureza procurará compreender o porque deste ataque. A planta está enfraquecida? O inseto está com fome por falta de um posto natural? Chega-se até a plantar alimentos para o inseto considerado ‘praga’, reconhecendo que este, como todo ser natural, merece viver. Este convívio pacífico com a natureza faz com que o agricultor não precise mais declarar guerra química na sua propriedade, produzindo assim alimentos de qualidade e limpos, sem comprometer a qualidade da água nem do solo. A cooperação nos leva a ver tudo como sendo interligado. Não é: “eu contra você”, mas “eu junto com você”. Não é: eu contra a praga, mas eu trabalhando em conjunto com a natureza, dentro de um contexto. Desaparece o sentido da fragmentação, de ver um mundo como formado de peças separadas, passando a ver o mundo como um todo integrado, onde mudanças em um elemento dentro do sistema (agrícola ou social), modifica a situação de muitos outros elementos que estão interligados com este. Isto é o que transforma o sistema todo. (texto adaptado do Instituto de Permacultura da Bahia) |
Por David Holmgren, em “Permaculture: Principles and Pathways Beyond Sustainability“, 2002:
Princípio 1: Observe e interaja.
Ao tomar o tempo para se envolver com a natureza nós podemos projetar soluções que se adequam a nossa situação particular.Esse ícone para este princípio de design representa uma pessoa “tornando-se” uma árvore. Na observação da natureza é importante tomar diferentes perspectivas para ajudar a entender o que está acontecendo com os vários elementos do sistema. O provérbio nos lembra que nós colocamos nossos próprios valores no que observamos, no entanto, na natureza, não há certo ou errado, apenas diferente. Princípio 2: Obtenha e armazene energia.
Sistemas que coletam e desenvolvem recursos quando eles são abundantes para podermos usá-los em momentos de necessidade.Esse ícone para este princípio de design representa a energia que está sendo armazenado em um recipiente para o uso mais tarde, enquanto o provérbio nos lembra que temos um tempo limitado para capturar e armazenar energia. Princípio 3: Obtenha rendimento.
Certifique-se de que você está recebendo recompensas verdadeiramente úteis como parte do trabalho que você está fazendo.O ícone desse princípio design, um vegetal, com uma mordida fora dela, mostra-nos que há um elemento de concorrência na obtenção de um rendimento, enquanto o provérbio nos lembra que devemos começar recompensas imediatas para nos sustentar. Princípio 4: Aplique a autorregulação e aceite feedback.
Precisamos desencorajar atividades impróprias para assegurar que os sistemas possam continuar a funcionar bem.O ícone de toda a terra é o exemplo maior escala que temos de uma auto-regulação “organismo” que está sujeita a controles de feedback, como o aquecimento global. O provérbio nos lembra que o feedback negativo é muitas vezes lento a surgir. Princípio 5: Use e valorize recursos e serviços renováveis.
Faça o melhor uso da abundância da natureza para reduzir o nosso comportamento de consumo e dependência de recursos não renováveis.O ícone do cavalo representa tanto um serviço de renováveis e de recursos renováveis. Ele pode ser usado para puxar uma carroça, arado ou login e pode até mesmo ser comido – um uso não consome é preferido em relação a consumir um. O provérbio nos lembra que o controle sobre a natureza através da utilização excessiva de recursos e alta tecnologia não é só caro, mas pode ter um efeito negativo sobre o meio ambiente. Princípio 6: Produza sem desperdício.
Ao valorizar e fazer uso de todos os recursos que estão disponíveis para nós, nada vai para o lixo.O ícone da minhoca representa um dos recicladores mais eficazes de materiais orgânicos, que consomem plantas e animais “resíduos” em valioso alimento de planta. O primeiro provérbio nos lembra que a manutenção periódica evita o desperdício, enquanto o segundo lembra-nos que é fácil de ter um desperdício em tempos de abundância, mas esse desperdício pode ser uma causa de dificuldades mais tarde. Princípio 7: Planeje dos padrões para os detalhes.
Ao voltar atrás, podemos observar os padrões da natureza e da sociedade. Estes podem formar a espinha dorsal de nossos projetos, com os detalhes preenchidos à medida que avançamos.Cada web de aranha é exclusivo para a sua situação, mas o padrão geral de raios radiais e anéis em espiral é universal. O provérbio nos lembra que quanto mais nos aproximamos de algo, mais estamos distraídos do quadro geral. Princípio 8: Integrar em vez de segregar.
Ao colocar as coisas certas no lugar certo, as relações se desenvolvem entre eles e apoiar uns aos outros.Este ícone representa um grupo de pessoas de uma visão panorâmica, de mãos dadas em um círculo juntos. O espaço no centro poderia representar “o todo é maior do que a soma das partes”. O provérbio sugere que quando trabalhamos juntos o trabalho torna-se mais fácil. Princípio 9: Use soluções pequenas e lentas.
Sistemas pequenos e lentos são mais fáceis de manter do que os grandes, uma melhor utilização dos recursos locais e produzem resultados mais sustentáveis.O caracol é tanto pequeno e lento, ele carrega sua casa nas costas e pode retirar-se para defender-se quando ameaçado. O primeiro provérbio nos lembra das desvantagens de tamanho excessivo e do crescimento enquanto o segundo provérbio incentiva a paciência, enquanto refletia sobre uma verdade comum na natureza e na sociedade. Princípio 10: Use e valorize a diversidade.
Diversidade reduz a vulnerabilidade de uma variedade de ameaças e tira vantagem da natureza única do meio ambiente no qual ele reside.O notável adaptação do Spinebill e beija-a pairar e saborear o néctar das flores, longas e estreitas, com sua espinha-como o bico simboliza a especialização de forma e função na natureza. O provérbio “não colocar todos os ovos na mesma cesta” nos lembra que a diversidade oferece seguro contra as variações do nosso meio ambiente. Princípio 11: Use as bordas e valorize as margens.
A interface entre as coisas é onde os eventos mais interessantes acontecem.Estes são muitas vezes os elementos mais valiosos, diversos e produtivos no sistema.O ícone do sol nascendo no horizonte com um rio em primeiro plano nos mostra um mundo composto de arestas. Também pode ser um caminho pelo meio das montanhas em direção ao Sol. O provérbio nos lembra que a mais popular, não é necessariamente a melhor abordagem. Princípio 12: Use e responda criativamente às mudanças.
Nós podemos ter um impacto positivo na mudança inevitável por observando cuidadosamente, e depois intervir no momento certo.A borboleta é um símbolo positivo de mudança transformadora na natureza, a partir de sua vida anterior, como uma lagarta. O provérbio nos lembra que a compreensão da mudança é muito mais do que uma projeção linear. Fontes: |
A permacultura não é apenas uma técnica ou muito menos um pacote. É muito mais complexo que uma simples agricultura sem agrotóxicos, mais complexo que uma agricultura ecológica, ou sustentável, ou biodinâmica ou que sistemas agroflorestais. É uma forma de viver que pode ou não envolver essas e outras técnicas. Ao mesmo tempo é muito mais simples por ser a conduta natural das coisas. Necessita apenas de uma observação sem máscaras, da natureza, sem pressa e com atenção. Sem preconceitos.
Permacultura é um sistema de planejamento de ambientes humanos complexos e sustentáveis em todos seus aspectos, onde cada item desse sistema tem suas características, necessidades e funções, sendo conectados de forma consciente pelo designer.
Veja mais sobre o que é permacultura em:
Núicleo de Permacultura da UFSC – NEPERMA