Lagostim-escavador – Parastacus saffordiNome em português: Lagostim-escavador, Lagostim-de-água-doce
Nome em inglês: –
Nome científico: Parastacus saffordi Faxon, 1898Origem: Brasil (SC e RS) e Uruguai
Tamanho: até 10 cm
Temperatura: 12-21° C
pH: indiferente
Dureza: indiferente
Reprodução: especializada, todo ciclo de vida em água doce
Comportamento: pacífico
Importante!!
Todos os Parastacus brasileiros são espécies vulneráveis, ameaçadas pela destruição do seu habitat. Não constam em listas oficiais como o Livro Vermelho do MMA/IBAMA, mas somente pela escassez de informações. Basta lembrar que a espécie mais comum de Parastacus (P. brasiliensis) consta na lista estadual como “vulnerável”, sendo assim este status pode ser estendido para todas as outras cinco espécies, que são mais raras.
Desta forma, esta espécie não pode e não deve ser coletada na natureza, ou mantida em cativeiro. |
Apresentação
Os Lagostins dulcícolas brasileiros são um grupo bastante peculiar de decápodes, com particularidades que os tornam bastante distintos dos Lagostins mais comumente encontrados como animais de aquário. Existem seis espécies de Lagostins de água doce no Brasil, todos do gênero Parastacus. Embora sejam chamados de “aquáticos”, na realidade são espécies escavadoras, que passam boa parte da sua vida enterrada em tocas construídas em terrenos úmidos e alagados.
Têm uma distribuição bastante restrita no país, sendo encontrados somente nas planícies do extremo sul (estados de RS e SC), habitando preferencialmente áreas pantanosas e margens de pequenos córregos.
Nestas seis espécies, existem dois padrões distintos de comportamento e modo-de-vida: as espécies chamadas de “fossoriais”, que escavam tocas profundas em locais pantanosos, vivendo em bolsões de água com baixa oxigenação no fundo destas tocas; e as espécies que habitam locais marginais de pequenos riachos de fraca correnteza, ocultos em meio aos detritos, raízes da vegetação ciliar, ou escavando tocas mais superficiais.
O Parastacus saffordi pertence ao primeiro grupo (“fossoriais”), e é uma espécie com distribuição relativamente mais ampla dentre os lagostins nativos.
Etimologia: O nome Parastacus vem do nome de outro gênero de lagostins dulcícolas da Eurásia, Astacus (do grego αστακός, astacós, significa lagosta ou lagostim), com o prefixo grego para (junto com, além de, alterado, contrário). Os Parastacus eram originalmente classificados como Astacus. Esaffordi é uma homenagem ao naturalista norte-americano William Edwin Safford (1859-1926). Os primeiros espécimes deste lagostim foram coletados por ele, na expedição do U.S.S. Vandalia ao Uruguai.
Origem
O Parastacus saffordi é uma espécie encontrada no Brasil (estado de SC, e mais raramente no RS) e Uruguai. Há um duvidoso relato de coleta no Norte da Argentina. Distribuição geográfica de Parastacus saffordi. Imagem original Google Maps; dados de Buckup L. In: Melo GAS. 2003.
Aparência
Seu aspecto lembra bastante os demais lagostins límnicos, com o corpo cilíndrico, primeiro par de patas adaptadas na forma de robustas quelas, um abdômen longo e musculoso terminando em urópodos dispostos em um leque caudal. Pernas ambulatórias dispostas lateralmente, além das garras maiores, os dois primeiros pares ambulatórios também possuem pequenas quelas.
Porém, uma análise mais minuciosa mostra algumas adaptações para seus hábitos escavadores, tendo um abdômen relativamente curto, devido à perda da sua importância como estrutura locomotora. Os quelípodos são curtos e globosos, e os dáctilos se movem em um plano vertical, para maior eficácia durante o processo de escavação e transporte de material.
Coloração numa tonalidade marrom avermelhada. Em relação aos demais Parastacus brasileiros, o P. saffordi pode ser identificado baseado na presença de pêlos longos, reunidos em tufos, cobrindo apenas a face interna dos dedos das quelas; margem dorsal e ventral da palma convexas; limites da aréola assinalados por elevações modestas e apenas na área anterior; presença de espinho no lobo basal do exopodito dos urópodos.
Parastacus saffordi, fotografado em Tapera, Florianópolis, SC. A primeira foto do artigo é do mesmo animal. Fotos gentilmente cedidas por Marcelo Venturi.
Parâmetros de Água
Existem poucos dados disponíveis, mas esta espécie é simpátrica e tem modo de vida semelhante ao P. defossus, provavelmente requerendo condições ambientais similares. É uma espécie fossorial, passa boa parte da sua vida habitando galerias subterrâneas escavadas em terrenos relativamente distantes de sistemas de água abertos.
Possivelmente mostra adaptações a condições ambientais extremas, já que a água subterrânea destas habitações possui valores de pH e oxigenação bem baixos, um ambiente bastante inóspito para a maioria dos animais aquáticos.
Dimorfismo Sexual e Reprodução
Todos os Parastacus brasileiros são intersexuados, apresentando orifícios genitais masculinos e femininos no indivíduo adulto, poro genital masculino no coxopodito do pereiópodo 5, e poro feminino no coxopodito do pereiópodo 3.
O P. saffordi parece ter intersexualidade permanente, mas existem poucos estudos. Pode haver hermafroditismo sequencial, mas não há informações. Não há diferença no seu aspecto externo, todos os indivíduos apresentando orifícios masculinos e femininos no indivíduo adulto. Porém, com a dissecção e análise da anatomia interna é possível a identificação de gônadas masculinas ou femininas (nunca as duas).
Todos os lagostins têm fertilização externa. Durante a cópula, o macho deposita seu espermatóforo na superfície ventral da fêmea. Quando os oócitos maduros são liberados através dos gonóporos femininos, o espermatóforo se dissolve e os espermatozóides ficam livres. Os oócitos são então fertilizados externamente, e são agrupados em uma massa que é fixada aos pleópodos por uma substância adesiva.
Produzem ovos de grandes dimensões, apresentam desenvolvimento pós-embrionário direto, onde as fases larvais completam-se ainda dentro do ovo. Na eclosão são liberados indivíduos já com características semelhantes ao adulto, sem fase larval. Muito provavelmente esta espécie mostra cuidado parental, os filhotes permanecem fixos aos pleópodos da mãe, até ficarem independentes.
Comportamento
O Parastacus saffordi é uma espécie de lagostim brasileiro com um modo de vida fossorial, passa boa parte da sua vida abaixo da superfície, habitando complexas galerias subterrâneas, sendo chamados por alguns de cavadores ou escavadores primários. Preferem solos argilosos para a construção de suas tocas.
São galerias profundas, podendo atingir até 2 metros de profundidade, descem até atingir o lençol freático, terminando numa galeria com um bolsão de água maior. A periferia das aberturas é freqüentemente elevada pela construção de torres cônicas ou chaminés argilosas protetoras, que circundam suas aberturas, formadas por um acúmulo de sedimento removido pelo lagostim durante a escavação. Entretanto, estas chaminés parecem ter um papel também funcional, visando impedir o alagamento excessivo das tocas com água das enchentes ou da chuva.
Como os demais crustáceos, tornam-se vulneráveis após a ecdise, e podem ser predados por outros animais. Por este motivo, nesta época permanecem entocados, até a solidificação completa da carapaça.
Sendo uma espécie fossorial, é bem provável que seja uma espécie pouco agressiva, possivelmente uma adaptação evolutiva para seu modo de vida escavatório, muitas vezes com colônias de vários indivíduos habitando uma mesma toca, em contraste com as demais espécies de “águas abertas”.
Chaminés nas aberturas das tocas do Parastacus saffordi, fotografado em uma pastagem na Fazenda Experimental da Ressacada, Centro de Ciências Agrárias, UFSC. Fotos gentilmente cedidas por Marcelo Venturi.
Alimentação
Estes animais são onívoros oportunistas, sendo que a dieta consiste principalmente de detritos de origem vegetal, em especial nestas espécies fossoriais, que pouco abandonam suas habitações para procurar alimentos.
Manutenção em cativeiro
Como já mencionado, os lagostins nativos são animais ameaçados, embora o Parastacus saffordi não conste em relações oficiais como o Livro Vermelho do Ministério do Meio Ambiente e IBAMA por carência de dados (DD pelos critérios do IUCN). No Livro Vermelho do Uruguai, a espécie é classificada como Vulnerável (VU). Desta forma, esta espécie não deve ser coletada na natureza, ou criada em aquários.
Bibliografia:
- Buckup L. Família Parastacidae. In: Melo GAS. Manual de Identificação dos Crustacea Decapoda de água doce do Brasil. São Paulo: Editora Loyola, 2003.
- Noro CK. A História natural de Parastacus defossus Faxon, 1898 um lagostim fossorial do Brasil meridional (Crustacea, Decapoda, Parastacidae). 2007. Tese (Doutorado em Biologia Animal) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
- Rudolph E, Almeida A. On the sexuality of South American Parastacidae (Crustacea, Decapoda). Invertebrate Reproduction and Development. 01/2000; 37:249-257.
- Castiglioni DS. Biologia reprodutiva do lagostim Parastacus varicosus Faxon, 1898 (Decapoda : Parastacidae) da Bacia do Rio Gravataí, Rio Grande do Sul. 2006. Tese (Mestrado em Biologia Animal) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
- Faxon CE. Observations on the Astacidae in the United States National Museum and in the Museum of Comparative Zoology, with descriptions of new species. Smithsonian Institution Press, Washington, 1898.
- Hobbs Jr. HH. 1989. An illustrated checklist of the American crayfishes (Decapoda: Astacidae, Cambaridae, and Parastacidae). Smithsonian Contributions to Zoology 480:1–236.
- Reynolds J, Souty-Grosset C. Management of Freshwater Biodiversity: Crayfish as Bioindicators. Cambridge University Press, 2011 – 374 p.
- http://www.iucnredlist.org/details/153637/0
Agradecimentos ao Agrônomo Marcelo Venturi (Centro de Ciências Agrárias, UFSC) pela cessão das fotos do artigo. O site da Fazenda Experimental da Ressacada, onde foi fotografado o Lagostim pode ser visitado aqui . |